Tribuna global
NUSO Nº 305 / Mayo - Junio 2023

A América Latina e a caixa de Pandora do unilateralismo das grandes potências

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A guerra de agressão da Rússia na Ucrânia evidenciou a crise da ordem global. Vinte anos após a invasão do Iraque pelos Estados Unidos, é necessário revisitar os marcos do processo que levou a essa crise para discutir um sistema multilateral mais justo e adaptado ao século XXI, no qual a América Latina deve ter uma palavra a dizer.

América Latina y la caja de Pandora del unilateralismo de las grandes potencias

«Iniciar uma guerra de agressão não é apenas um crime internacional; é o supremo crime internacional, que difere de outros crimes de guerra pois contém dentro de si mesmo o mal acumulado do todo». Essas foram as palavras do juiz estadunidense Francis Biddle, em 30 de setembro 1946, ao ler a sentença final do Tribunal Militar Internacional de Nuremberg, em que foram julgados 22 dos maiores líderes políticos e militares da Alemanha nazista sobrevividos à guerra. O termo «agressão» foi repetido 36 vezes na sentença, sendo que a principal imputação contra os réus foi a de ter cometido «crimes contra a paz, a saber: planejar, preparar, iniciar ou travar uma guerra de agressão, ou uma guerra em violação a tratados internacionais»1.

Após as dezenas de milhões de vítimas e as incontáveis destruições materiais provocadas pela Segunda Guerra Mundial, as nações aliadas que derrotaram o nazifascismo (Estados Unidos, União Soviética, Grã-Bretanha e França) promoveram a criação de uma nova organização internacional, as Nações Unidas, com o objetivo de «preservar as gerações vindouras do flagelo da guerra», como afirma o preâmbulo da Carta da ONU, que entrou em vigor em 24 de outubro 19452. Logo no início, o artigo 2.4 da Carta especifica que «todos os membros deverão evitar em suas relações internacionais a ameaça ou o uso da força contra a integridade territorial ou a dependência política de qualquer Estado». A relação entre as grandes potências foi enquadrada nessa norma durante quase oito décadas, conferindo uma medida de estabilidade ao sistema internacional e evitando conflitos maiores, em particular com o uso de armas nucleares. Ao mesmo tempo, foi progressivamente construído um regime de afirmação de direitos (políticos, econômicos, sociais, de gênero e, mais recentemente, ambientais) que, em maior ou menor grau, vem pautando e influenciando as relações internacionais. Hoje nos deparamos com a crise destes dois pilares da convivência internacional – a não-agressão e a defesa dos direitos humanos.
O mundo inteiro lembrou, em 24 de fevereiro de 2023, o primeiro aniversário da invasão da Ucrânia pela Rússia. É impossível subestimar o impacto, presente e futuro, da injustificável agressão russa, que colocou de volta a guerra de agressão, de anexação territorial, no coração da Europa e entre as ferramentas reais da política externa das grandes potências. Estamos diante de uma crise profunda dos instrumentos de regulação das relações internacionais que, com todos os seus limites e defeitos, criaram normas de convivência que têm moldado todos os âmbitos de nossas vidas. O sistema multilateral, criado pelos EUA e as demais «Nações Unidas», foi crucial para criar e manter canais diplomáticos fluidos, diminuir gradativamente o uso da violência nas relações internacionais, o número de conflitos e de vítimas, e evitar o uso de armas de destruição em massa. Este processo vem se revertendo aceleradamente desde de 20113. Até acordos mínimos entre as grandes potências se tornaram cada vez mais difíceis. A invasão russa faz parte de um contexto de deterioração das relações internacionais em que as ações unilaterais vão se acumulando. 

Algumas efemérides podem colocar este conflito em perspectiva histórica, e ajudar a entender como e por que chegamos a este ponto de inflexão, para além da retórica dos líderes das grandes potências. Vinte anos atrás, em 20 de março de 2003, uma coalizão militar dirigida pelos EUA invadiu o Iraque, com o objetivo de depor o ditador Saddam Hussein, destruir o exército iraquiano e colocar no poder um governo aliado. O pretexto para a invasão foi a suposta presença de «armas de destruição de massa» no país, com as quais o regime de Hussein poderia ameaçar o Ocidente. Era uma mentira sem fundamento, que a administração neocon do então presidente George W. Bush propagou às chancelarias e à mídia do mundo inteiro – as fake news e a desinformação não são exclusividade das redes sociais, que à época nem existiam. Além dos EUA, no momento da invasão e até 2009, 40 diferentes nações enviaram tropas para o Iraque: o maior contingente foi o da Grã-Bretanha, com 46.000 soldados, e o menor, o da Islândia, com apenas dois homens. Entre outros países ex-integrantes da antiga área de influência da URSS, a Ucrânia enviou 1.650 soldados. Na «Coalition of the Willing» (Coalizão dos Dispostos), montada pelos EUA com duríssimas pressões diplomáticas, entraram também quatro países latino-americanos: República Dominicana, El Salvador, Honduras e Nicarágua (à época, sob a presidência do empresário conservador Enrique Bolaños). El Salvador enviou o maior contingente militar (5.800 soldados) e sofreu várias baixas4.

A Carta das Nações Unidas estabelece que os países membros da organização (hoje são 193) só podem usar a força em autodefesa (artigo 51)5, ou com a autorização do Conselho de Segurança (artigo 42)6. A autorização precisa de pelo menos nove votos favoráveis entre os 15 integrantes do Conselho. Estes são cinco membros permanentes, com direito de veto (os assim chamados P-5: EUA, Grã-Bretanha, França, Rússia e China), e 10 membros não-permanentes, sem direito de veto, eleitos com mandato de dois anos. Em 2003, Bush e o então primeiro-ministro inglês Tony Blair obtiveram somente quatro votos no Conselho (além de EUA e Grã-Bretanha, Espanha e Bulgária) e decidiram ir em frente sem o respaldo da ONU. A invasão do Iraque aconteceu ao arrepio do direito internacional e foi ilegítima e ilegal, como afirmou meses mais tarde o então secretário-geral da ONU, Kofi Annan. Esta declaração lhe custou caro: a mídia anglo-americana, após ter engolido sem hesitar as mentiras sobre as armas de Saddam, se lançou numa campanha de destruição da reputação de Annan, acusando-o, sem provas ou fundamento, de ter coberto um grande esquema de corrupção na chamada operação «Petróleo por Alimentos»4.

A invasão do Iraque foi bem-sucedida no plano militar imediato, com a deposição de Hussein e a aniquilação do exército iraquiano, mas terminou numa catástrofe política e humanitária. A ONU, chamada às pressas para tentar catar os cacos da destruição das estruturas do estado iraquiano, pagou um preço alto. Um atentado em Bagdá, em 19 de agosto 2003, custou a vida a 22 funcionários da organização. Entre eles, o chefe da missão da ONU no país, o brasileiro Sergio Vieira de Mello, considerado por muitos um forte candidato a suceder a Kofi Annan como secretário-geral. Até hoje, o Iraque continua afundado no caos e na instabilidade. Incapazes de resolver os problemas criados, as tropas da coalizão foram se retirando pouco a pouco. As últimas unidades dos EUA cessaram todas as operações de combate em dezembro 2021. Quatro meses antes, as tropas dos EUA tinham deixado às pressas também o Afeganistão.

A operação Iraqi Freedom (Liberdade para o Iraque) representou o auge do hubris dos EUA na cena internacional após o fim da Guerra Fria e do contraponto ao seu poder – militar e diplomático – representado pela URSS e seus países satélites. Não foi a primeira nem a última vez que os EUA e seus aliados usaram a força de forma unilateral nas últimas três décadas. Em 24 março 1999, a aliança militar Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), liderada por Washington (o presidente à época era o democrata Bill Clinton), iniciou bombardeios aéreos contra as forças armadas daquilo que ainda sobrava da República Federal da Iugoslávia (ou seja, à época, Sérvia e Montenegro), que estavam combatendo contra a guerrilha que almejava a separação da província de Kosovo para se juntar à vizinha Albânia – um cenário não tão diferente do que aconteceria 15 anos depois, em março 2014, quando separatistas filo-russos declararam a independência do Dombas, no sudeste da Ucrânia, e o Exército ucraniano iniciou operações militares para reconquistar o território perdido.

No caso de Kosovo, os EUA e a OTAN agiram sem a autorização do Conselho de Segurança da ONU (que seria sem dúvida bloqueada por um veto russo) e justificaram os bombardeios como uma «intervenção humanitária» para proteger a população civil de Kosovo dos ataques das tropas sérvias – de fato, milhares de civis de etnias albaneses tinham sido expulsos de suas casas, e havia registros de execuções e estupros de massa. O Brookings Institute, um dos mais influentes think-tanks dos EUA, chegou a teorizar que a OTAN estava autorizada para usar a força sem a aprovação da ONU, «se seus membros assim o desejassem, para enfrentar crises ou ameaças que não afetam diretamente o território aliado»8. Sob as bombas «humanitárias», no entanto, ficaram também centenas de civis sérvios e de refugiados kosovares. Num dos bombardeios, os caças da OTAN atingiram, voluntariamente, a redação da Radio Televisão da Sérvia (RTS) em Belgrado, matando 23 pessoas entre jornalistas e técnicos. Tony Blair explicou que o bombardeio da televisão teria sido «inteiramente justificado», uma vez que esta faria parte do «aparato da ditadura e do poder» do regime sérvio9.

Passamos para mais uma efeméride e uma frente de batalha: 19 março de 2011, Líbia. Naquele dia, os caças da OTAN e navios de guerra norte americanos e ingleses despejaram uma chuva de mísseis contra as tropas de Muammar Gaddafi, para tentar proteger os milhares de civis que, em Benghazi, pela primeira vez tinham ousado sair às ruas contra o regime, e vinham sendo massacrados. Neste caso, a intervenção foi sacramentada pelo Conselho de Segurança, que em 17 março 2011 aprovou uma resolução demandando um cessar-fogo imediato às tropas líbias, e autorizando a comunidade internacional a utilizar todos os meios necessários, menos uma ocupação militar, para proteger os civis. EUA, Grã-Bretanha, França e sete membros não permanentes do Conselho votaram a favor da resolução número 1973. China e Rússia se abstiveram, assim como três membros não permanentes: Alemanha, Índia e Brasil. Mas a «intervenção humanitária» se transformou em poucos dias numa ofensiva aérea total da OTAN contra o governo líbio, enquanto no terreno explodia uma guerra civil. Gaddafi foi executado no final de outubro 2011, e o país afundou no caos, de onde até agora não saiu. A Líbia tornou-se porto seguro para movimentos fundamentalistas e grupos criminosos de todos os tipos, enquanto o governo é disputado por grupos armados apoiados por diferentes potências estrangeiras.

Para China e Rússia, a operação da OTAN na Líbia deixou uma lição douradora. As intervenções humanitárias, eles concluíram, não passavam de uma fachada para justificar mudanças de regime impostas com as armas, visando eliminar governos que os EUA e seus aliados consideravam indesejáveis. Como consequência, no caso da guerra civil na Síria – que também se iniciou em março 2011 –, Rússia e China vetaram conjuntamente, até março 2023, 10 projetos de resoluções, e a Rússia vetou independentemente outras sete10. Na prática, Rússia e China protegeram o regime de Bashar al-Assad, um aliado-chave para Moscou (desde 1971, a Marinha russa mantém no porto de Tartus, no nordeste da Síria, sua única base no Mar Mediterrâneo). Esse conflito, que provocou a morte de mais de 300.000 civis11 e a destruição total de vastas áreas do país, também reabriu a disputa geopolítica no Oriente Médio, após décadas de influência quase exclusiva dos EUA.

A legitimidade da norma de não-modificação de fronteiras territoriais através da agressão armada e as normas de respeito aos direitos humanos se esfarelam diante de ações de caráter unilateral e que não têm base em qualquer negociação ou consenso entre as potências globais. A expansão da OTAN tem tido um papel crucial nesse processo de esfacelamento. A expansão do número de países membros (dos 12 originais para os atuais 31) não é o ponto crucial a ser salientado, mas sim a expansão de papel da organização. Após a Guerra Fria, a OTAN abandonou sua definição inicial de uma aliança de defesa coletiva e, a partir dos anos 1990, passou por um processo de «globalização», estando presente fora da área dos países membros (como foi o caso no Afeganistão) e redefinindo ameaças à segurança do Atlântico Norte em termos de instabilidades, extremismos, falência de Estados ou desrespeito pelos direitos humanos12. Assim, as questões relativas à ordem internacional e à estabilidade global são discutidas no âmbito da OTAN, com uma perspectiva estritamente ocidental, em contraposição aos fóruns multilaterais do sistema da ONU.

A nova missão global da OTAN se espelha na renovada assertividade da Rússia, após a chegada de Vladimir Putin ao poder, em 1999. Putin firmou sua liderança interna e seu papel internacional usando o punho de ferro na guerra contra os independentistas chechenos (1999-2009) e demonstrando disposição para flexionar os músculos diplomáticos e militares da Rússia, como nos velhos tempos soviéticos. Entre 27 fevereiro e 16 março 2014, com uma ação rápida e sem qualquer reação internacional mais enérgica, o Exército russo invadiu e anexou de forma unilateral a Crimeia, que havia sido parte integrante da Ucrânia desde 1954. Possivelmente, o governo autocrático de Putin imaginou que, sete anos depois, a anexação do Donbas ocorresse da mesma maneira, relativamente indolor. O cálculo, como sabemos, se demostrou catastrófico: a Ucrânia conseguiu resistir ao ataque russo inicial e rapidamente começou a receber enormes quantidades de ajudas militares (dos EUA e da OTAN) e econômicas (da União Europeia, do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial). Do ponto de vista militar, o conflito está em um impasse, e o tempo não parece jogar a favor de Putin. As tropas russas provocaram enormes destruições nas cidades e infraestruturas ucranianas, mas também foram incapazes de dobrar a resistência de um país relativamente pequeno e, em teoria, muito inferior militarmente. Para além da ameaça nuclear, as garras do urso russo demonstraram não ser tão afiadas no embate com tropas com equipamentos modernos.

Invasões para conquista territorial e intervenções «humanitárias» não são equivalentes, é claro, mas o uso da força de forma unilateral reabriu uma caixa de Pandora que havia sido, mal ou bem, tampada durante décadas. Os Estados passaram novamente a colocar suas máquinas militares a produzir dor e morte a partir de decisões tomadas em suas capitais, baseadas em cálculos políticos mais ou menos míopes ou cínicos, sem referência às instituições multilaterais e evitando negociações prévias que esgotassem todas as possíveis soluções diplomáticas para os conflitos latentes. Desta forma, as interpretações das crises tendem a se retroalimentar a partir da retórica nacionalista ou soberanista de cada lado envolvido, com narrativas que não conversam entre si e dificultam a mediação necessária para chegar a algum tipo de ajuste ou compromisso entre as partes – algo indispensável, já que a esmagadora maioria dos conflitos termina por um acordo de paz e não pela rendição de um dos contendentes. A invasão da Ucrânia deixou evidente, mais uma vez, a incapacidade do sistema multilateral para responder às ameaças à segurança e ao direito internacional quando estas são causadas pelas ações de uma das potências nucleares com assento permanente e direito de veto no Conselho de Segurança da ONU. O comportamento destas potências se reflete também nas atitudes e ações de Estados menores que – da Etiópia a Israel, da Arábia Saudita a Ruanda – não hesitam em usar as armas contra países vizinhos, confiantes na impunidade garantida pela força e/ou pela proteção política oferecida por um dos P-5.

Para além de incontáveis vítimas, a agressão russa contra a Ucrânia causou também uma aceleração brutal da remodelação, já em andamento, dos equilíbrios geopolíticos globais. Em 2003, no momento da invasão do Iraque, os EUA eram a potência hegemônica inconteste num mundo essencialmente unipolar. Vinte anos depois, a China é o maior parceiro comercial do mundo inteiro, com um PIB comparável ao dos EUA, e disputa palmo a palmo a supremacia econômica e diplomática global – inclusive nas diferentes entidades das Nações Unidas13. Esta ofensiva tem sido especialmente exitosa na África, onde na última década a China se tornou a principal fonte de empréstimos e investimentos estrangeiros diretos (IED)14. As empreiteiras chinesas dominam também a construção das obras de infraestrutura nos quatro cantos do continente. Para a maioria dos governos africanos, a China é um parceiro preferível aos organismos internacionais e aos governos dos países ocidentais, porque empréstimos e investimentos são geralmente mais rápidos e menos burocráticos e, ainda mais importante, não são condicionados por temas politicamente sensíveis, como respeito pelos direitos humanos, governança democrática, combate à corrupção e promoção da igualdade de gênero.

Esta nova multipolaridade ficou evidente nas votações na Assembleia Geral da ONU, o mais democrático dos organismos das Nações Unidas, onde todos os países são representados e não há direito de veto (mas cujas resoluções, ao contrário das do Conselho de Segurança, não têm poder vinculante). Entre 2 de março 2022 e 24 fevereiro 2023, a Assembleia Geral votou diferentes resoluções sobre a guerra na Ucrânia, que tiveram resultados parecidos: entre 141 e 143 países condenando a invasão, entre 5 e 7 votando contra as resoluções (além da própria Rússia, Belarus, Eritreia, Coreia do Norte, Síria, Mali), e entre 32 e 35 se abstendo; mais de uma quinzena de países preferiram não participar em uma ou outra das votações15. A maioria das abstenções se concentrou na Ásia – a começar por China, Índia e Paquistão – e na África. Na América Latina, os países que, desde a primeira votação, se abstiveram ou não participaram ao voto foram os que mantêm laços econômicos, militares e ideológicos mais estreitos com o regime de Putin: Bolívia, Venezuela, Cuba e Nicarágua. Na votação de fevereiro 2023, pela primeira vez, a Nicarágua votou contra a resolução que condenou a invasão, alinhando-se completamente à Rússia.

Desde o início daquela que Moscou definiu hipocritamente como «operação militar especial» na Ucrânia, a China se declarou neutra no conflito e se disse defensora de negociações de paz, mas nunca criticou a invasão nem a descreveu como tal. Por outro lado, Pequim condenou os EUA e seus aliados europeus por causa das sanções contra a Rússia e da assistência militar prestada à Ucrânia. China e Rússia têm frequentemente se alinhado na crítica à ordem internacional liderada pelos EUA nas questões ligadas a paz e segurança, e compartilham uma ferrenha oposição a qualquer tipo de supervisão internacional (definida como ingerência) sobre temas que consideram como puramente internos: em primeiro lugar, o respeito dos direitos humanos. Há, no entanto, uma diferença significativa na estratégia dos dois países e em sua atuação nas Nações Unidas. 

A China não contesta a norma da não-mudança de fronteiras territoriais a partir de agressão militar (embora, evidentemente, do ponto de vista chinês essa norma não se aplica ao caso de Taiwan). No Conselho de Direitos Humanos da ONU, porém, o país não somente vota rotineiramente contra qualquer resolução para monitorar ou condenar praticamente qualquer abuso cometido por qualquer governo, como se opõe ao próprio conceito de pressão internacional. Como escreveu o ex-diretor executivo da Human Rights Watch, Kenneth Roth, «na opinião de Pequim, o Conselho deveria ser reduzido a um fórum para uma conversa educada e geral entre os governos, com a devida deferência à interpretação que cada nação soberana tem sobre os direitos humanos»16. A China defende uma visão que, essencialmente, reduz as obrigações em matéria de direitos humanos à capacidade de melhorar o padrão de vida da população e garantir o crescimento da economia. Segundo a posição oficial chinesa, «os interesses do povo são onde a causa dos direitos humanos começa e termina. Aumentar o sentimento de ganho, felicidade e segurança das pessoas é a busca fundamental dos direitos humanos, bem como o objetivo final da governança nacional. (...) Nós nos opomos ao uso dos direitos humanos como desculpa para interferir nos assuntos internos de outros países»17. É uma visão radical, que nega a noção de direitos individuais e agrada a muitos países em desenvolvimento, que querem manter as melhores relações possíveis com Pequim e, ao mesmo tempo, evitar qualquer censura em relação a suas próprias ações.

A Rússia, ao contrário da China, não goza de grande simpatia ou prestígio internacional e, há tempos, não tem mais um peso econômico à altura de seu ainda poderoso arsenal nuclear. Nos últimos anos, a narrativa de Putin se concentrou na defesa de supostos valores tradicionais de família, pátria e religião, e no ataque ao cosmopolitismo, a tolerância e a decadência das elites ocidentais. Um discurso que ressoa na retórica de líderes autoritários de extrema direita mundo afora, de Donald Trump a Jair Bolsonaro, de Recep Erdoğan a Viktor Orbán. Enquanto a China investe recursos e energias para construir um soft power global que possa concorrer com o dos EUA, o aparato de propaganda e desinformação russo se concentra em destacar qualquer coisa que possa fazer a vida no Ocidente parecer ruim, e em negar os fatos que possam afetar a imagem da Rússia18

Após mais de um ano de combates violentíssimos e terríveis sofrimentos impostos à população civil, a guerra na Ucrânia virou a demonstração incontestável da crise dos dois pilares normativos lembrados acima. Cabe agora perguntar o que será possível reconstruir da arquitetura internacional em ruínas, e com que base será possível, em algum momento, negociar o final do conflito, com o apoio das potências atuais, mas também dos novos atores que despontam no cenário global.

América Latina, multilateralismo e multipolaridade

Os impactos da guerra têm sido profundos para todo o Sul global. A invasão da Ucrânia acelerou a recessão econômica mundial, provocou a diminuição dos estoques globais de grãos (com forte aumento dos preços na África, o consequente crescimento da desnutrição e o impacto negativo na estabilidade política de vários países), afetou o comercio internacional e disparou uma corrida armamentista nos países ocidentais que, para compensar os custos gerados pela guerra, vêm retirando recursos dos programas de ajuda internacional ao desenvolvimento. A América do Sul, grande produtora de commodities agrícolas, escapou da escassez de alimentos (e teve até alguma vantagem no aumento das exportações), mas deve enfrentar agora escolhas complexas para responder à recomposição geopolítica global.

Desde que a maioria dos países latino-americanos se tornaram independentes, no início do século XIX, eles têm ficado na área de influência dos EUA, que exerceram seu poder com um mix de diplomacia, força bruta (econômica e, quando necessário, militar) e hegemonismo cultural. Enquanto México e América Central, por razões geográficas e históricas, continuam com a bússola apontada quase exclusivamente para os EUA, desde o início deste século a América do Sul começou um processo de lenta diversificação de suas trocas comerciais e de sua política internacional. Este processo iniciou-se com a eleição, entre 1998 e 2006, de líderes de esquerda ou progressistas nos principais países da região. Em 2005, uma frente liderada por Luiz Inácio Lula da Silva (Brasil), Néstor Kirchner (Argentina) e Hugo Chávez (Venezuela) rejeitou definitivamente a proposta dos EUA de criar uma Área de Livre Comércio das Américas (ALCA), que teria ampliado em âmbito continental a camisa de força aceita pelo México ao assinar o Tratado Norte-Americano de Livre-Comércio (NAFTA, na sigla em inglês) de 199419. Os resultados econômicos desta escolha ficaram logo evidentes. Entre 2000 e 2020, o comércio da China com a América Latina e o Caribe cresceu 26 vezes e, de acordo com o Fórum Econômico Mundial, deve duplicar até 2035, alcançando mais de US$ 700 bilhões. Em 2021, as importações e exportações entre a China e a América do Sul (ou seja, sem o México) alcançaram US$ 247 bilhões – US$ 73 bilhões a mais do que os fluxos comerciais com os EUA no mesmo ano . No entanto, a China importa da América Latina essencialmente commodities (agrícolas e minerais) e exporta de volta produtos industriais manufaturados: o mesmo círculo vicioso que há décadas condena a região a um desenvolvimento fraco e frágil.

Do ponto de vista político e diplomático, a rejeição da ALCA marcou também o início de um período de grande efervescência para a região, com a criação de duas novas organizações intergovernamentais, a União de Nações Sul-Americanas (Unasul), integrada por 12 países da América do Sul (em 2008), e a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), com a participação de 33 países (em 2010). Ambas as iniciativas foram impulsionadas pela liderança do Brasil do presidente Lula da Silva, e concretizadas pela habilidosa ação dos seus dois estrategistas da política internacional, o ministro das relações exteriores Celso Amorim e o assessor especial Marco Aurélio Garcia. O governo Lula também se esforçou para relançar o Mercado Comum do Sul (Mercosul) e ampliar o número de países participantes21. Fora da região, o Brasil articulou a criação do Fórum de Diálogo Índia-Brasil-África do Sul (IBAS), que antecedeu a criação do grupo dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), formalizada em 201122.

Todos os esforços para aprofundar a integração regional, no entanto, foram implodidos após crise política no Brasil (o golpe parlamentar contra a presidenta Dilma Rousseff e a chegada ao poder da extrema direita de Jair Bolsonaro) e a eleição de presidentes conservadores na Argentina, Paraguai, Peru e Chile. A Unasul cessou de funcionar em 2018, e as outras entidades regionais entraram em animação suspensa. O BRICS continuou realizando as reuniões de cúpula anuais, mas sem qualquer coordenação política ou diplomática significativa. Apesar das muitas limitações e de um déficit estrutural de legitimidade, a única entidade regional que continuou funcionando ininterruptamente foi a Organização dos Estados Americanos (OEA), com sede em Washington. Trata-se da herdeira direta da União Internacional dos Estados Americanos (1890-1910), que deu lugar à União Pan-Americana (1910-1948), até que a OEA fosse criada em 1948: todas organizações ligadas aos EUA e seus interesses estratégicos.

A América Latina e o Caribe têm uma antiga tradição diplomática e multilateralista, em que os conflitos entre Estados têm sido resolvidos quase exclusivamente por diálogo e não pelas armas23. Uma dúzia de países da região participou da criação da Sociedade das Nações, em 1920, e 20 países estiveram entre as 51 nações fundadoras da ONU, em 1945. Mas, apesar da cansada retórica sobre a «Pátria Grande», a integração latino-americana continua uma quimera. É desanimador constatar que, num espaço temporal bem menor e em condições políticas mais complexas, a integração da África tenha avançado muito mais. A União Africana (UA), com 53 países membros, foi criada em 2001, sobre as bases da Organização da Unidade Africana (OUA), fundada no auge do processo de descolonização, em 1963. Em pouco mais de 20 anos, a UA se tornou um ator político reconhecido, influente a atuante na África, e independente das influências das antigas potências coloniais.

O ano de 2022 foi marcado pela eleição de presidentes de esquerda em três importantes países sul-americanos: Gabriel Boric no Chile, Gustavo Petro na Colômbia e Lula da Silva no Brasil. O líder brasileiro, que montou uma ampla frente progressista para conseguir derrotar Bolsonaro e voltar ao governo24, deixou claro ainda na pré-campanha eleitoral que suas prioridades em política exterior seriam o relançamento de Unasul, Celac, Mercosul e BRICS. Outra prioridade de Lula é a retomada da batalha diplomática para a reforma da composição do Conselho de Segurança da ONU: «É necessário reconstruir as instituições internacionais sobre novas bases, não podemos continuar com um sistema criado pela Segunda Guerra Mundial. É urgente (...) definir uma nova governança global justa e representativa, sem que ninguém tenha direito de veto»25. Mas apesar do brilho e do reconhecimento pessoal de Lula na cena internacional, o Brasil de hoje é a sombra da potência econômica (e diplomática) em que tinha se transformado em seus dois primeiros mandatos na Presidência (2003-2010)26. Segundo dados do FMI, o PIB brasileiro caiu de US$ 2,46 trilhões em 2012 para US$ 1,83 trilhão em 2022, e sua participação nos bens e serviços produzidos no mundo passou de 3,27% para 1,76%. Em outras palavras, despencou 46%. A brutal contração da economia brasileira afetou o peso global da América Latina como um todo. A América Latina concentra 8% da população global, mas, em 2022, a região como um todo respondeu por somente 5,26% do PIB mundial, em comparação a 7,95% em 2012. Em dez anos, uma contração de 33,85%27.

Na duríssima disputa pela primazia global entre China e EUA, a América Latina é hoje pouco mais que uma espectadora. Para mudar de patamar e adquirir algum protagonismo, a região deverá modificar profundamente seu modelo de desenvolvimento, apostando numa reindustrialização ambientalmente sustentável e em políticas ativas de redução das desigualdades sociais e econômicas. Nenhum país, nem o Brasil ou o México, tem condições de competir sozinho na arena global. A integração regional deve urgentemente passar da retórica à construção de instituições e burocracias sólidas autônomas e alternativas à OEA. Espelhando-se na experiência da UE, as futuras entidades regionais deveriam ser a expressão de interesses materiais concretos dos vários países e contar com estruturas institucionais robustas e de relativa independência em relação aos governos nacionais. Desta forma, não poderão ser destruídas com uma canetada, a depender do resultado das eleições nacionais. Relançar a Celac ou a Unasul sem repensar sua formulação, a partir da experiência concreta, poderia levar a mais um fracasso.

Do ponto de vista das relações internacionais, o interesse estratégico da América Latina é o de construir uma política comum de «não alinhamento ativo», buscando equidistância de Washington e Pequim, mas também buscando construir relações muitos mais próximas e robustas com os países da África e da Ásia Central. Como escreveram agudamente Carlos Fortín, Jorge Heine e Carlos Ominami, «este não alinhamento terá uma atitude proativa e será efetivamente não alinhado. Buscará oportunidades de expandir e não de limitar os laços de nossos países com esse vasto mundo não ocidental que surge ante nossos olhos, e que marcará o novo século»28. Seria um erro, porém, imaginar uma diplomacia latino-americana exclusivamente centrada nos interesses econômicos e que desconsidere os valores políticos comuns, assim como a experiência histórica concreta da região.

Gostemos ou não, a América Latina é o «extremo Ocidente», na aguda definição do politólogo francês Alain Rouquié, em que os valores da democracia liberal são profundamente arraigados. Desde a independência, por mais dois séculos, os Estados da região, até durante os frequentes regimes de exceção, nunca reivindicaram qualquer outro princípio de legitimidade além do de soberania popular através das urnas (a única exceção é a Cuba pós-revolucionária). Ao sul do Rio Bravo, não há o equivalente a «valores asiáticos» ou «autenticidade africana». Há, ao contrário, uma longa tradição de luta pela defesa dos direitos humanos e, para citar Hannah Arendt, pelo «direito de ter direitos». Como consequência deste esforço coletivo, em quase todos os países sul-americanos os responsáveis pelos crimes das ditaduras militares dos anos 1960-1980 foram processados e punidos a grande exceção foi o Brasil. Juntamente com a Europa, a América Latina é a região onde mais se realizaram processos por crimes internacionais29, e onde há uma forte jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), talvez o único instrumento significativo criado no âmbito do sistema da OEA.

A questão da jurisdição internacional no caso de crimes contra a humanidade, crimes de guerra e genocídio está de volta à agenda global após o Tribunal Penal Internacional (TPI) emitir, em 17 de março 2023, mandados de prisão contra Vladimir Putin e uma funcionária do governo russo em relação à deportação forçada de crianças da Ucrânia para a Rússia. Foi a primeira vez que o líder de uma grande potência ficou na mira do TPI. A medida foi festejada por Washington e denunciada com veemência pelo Kremlin. Mas enquanto EUA, Rússia e China nunca assinaram o Estatuto de Roma (1988), que deu origem ao Tribunal, 28 dos 35 países da América Latina e Caribe são membros plenos do mecanismo. O TPI, criado em 2002, baseia-se no princípio fundamental estabelecido pelos julgamentos de Nuremberg: a necessidade de responsabilização individual por crimes graves cometidos durante os conflitos, independentemente do status dos réus. Há uma evidente hipocrisia seletiva na aplicação deste princípio, já que nenhum militar ou líder político ocidental foi jamais acusado pelo TPI, por exemplo no caso dos crimes de guerra cometidos durante e após a invasão do Iraque. Mas é essencial defender e respeitar o princípio básico de que os politicamente responsáveis por crimes cometidos pelos Estados devem ser responsabilizados por suas ações. A América Latina é um continente que sofre com inaceitáveis níveis de desigualdade, violência, racismo e abusos dos aparatos repressivos dos Estados. Os mecanismos de defesa dos direitos humanos da ONU e do sistema interamericano têm sido instrumentos fundamentais na luta para o progresso e a consolidação democrática da região. Tradicionalmente, os adversários destes mecanismos se encontravam nas forças políticas e nos governos de direita, embora nos últimos anos, na América Latina, países como a Nicarágua e a Venezuela tenham se juntado a esse grupo30. Hoje, a crescente influência chinesa e a aparente consolidação de um multipolarismo com viés autoritário representam novas ameaças. As instituições multilaterais têm carências inegáveis, como a falta de representatividade do Conselho de Segurança da ONU e a desigualdade do regime de não proliferação nuclear, mas o caminho que vislumbramos hoje, em direção ao uso cada vez mais generalizado da violência de Estado e da rejeição aos direitos humanos, é assustador. O unilateralismo mata. É tempo de reconstruir um sistema multilateral mais justo e adequado ao século XXI. A América Latina tem um papel importante a desempenhar para defender estes princípios.

  • 1.

    O Tribunal Militar Internacional de Nuremberg condenou 19 dos réus e absolveu três. Dos condenados, 12 foram sentenciados à morte. Três dos réus foram condenados à prisão perpétua e quatro a penas entre 10 e 20 anos de encarceramento. As execuções foram realizadas por enforcamento no ginásio do Tribunal, em 16 de outubro 1946. Um dos condenados à morte, Hermann Göring, cometeu suicídio na noite anterior à execução. A sentença completa está disponível em avalon.law.yale.edu/imt/09-30-46.asp

  • 2.

    Carta das Nações Unidas (1945), disponível em <www.un.org/es/about-us/un-char...

  • 3.

    O Programa de Dados de Conflitos da Universidade de Uppsala (UCDP) registra e classifica os conflitos armados ao redor do mundo desde 1945. Os dados estão disponíveis em ucdp.uu.s

  • 4.

    Stephen A. Carney: Allied Participation in Operation Iraqi Freedom, Center of Military History United States Army, Washington, DC, 2011, disponível em history.army.mil/html/books/059/59-3-1/CMH_59-3-1.pdf

  • 5.

    «Nada na presente Carta prejudicará o direito inerente de legítima defesa individual ou coletiva no caso de ocorrer um ataque armado contra um Membro das Nações Unidas».

  • 6.

    O Conselho de Segurança «poderá levar a efeito, por meio de forças aéreas, navais ou terrestres, a ação que julgar necessária para manter ou restabelecer a paz e a segurança internacionais».

  • 8.

    Ivo H. Daalder: «NATO, the UN, and the Use of Force», Brooking Institute, Washington, DC, 1999.

  • 9.

    Richard Norton-Taylor: «Serb TV Station Was Legitimate Target, Says Blair» em The Guardian, 24/4/1999.

  • 10.

    Dados compilados pelo Council of Foreign Relations (EUA), atualizado até março de 2023, disponíveis em cfr.org/backgrounder/un-security-council

  • 11.

    Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos: «UN Human Rights Office Estimates More than 306,000 Civilians Were Killed over 10 Years in Syria Conflict», comunicado de imprensa, 28/6/2022.

  • 12.

    Os novos «Strategic Concepts» (conceitos estratégicos) da OTAN, oficializados em 1999 e 2010, estão disponíveis em natolibguides.info/nsc/documents

  • 13.

    Os novos «Strategic Concepts» (conceitos estratégicos) da OTAN, oficializados em 1999 e 2010, estão disponíveis em natolibguides.info/nsc/documents

  • 14.

    A Universidade John Hopkins mantém um banco de dados atualizado sobre a presença da China na África, disponível em sais-cari.org/data

  • 15.

    Na resolução votada em 23 de fevereiro de 2023, a Assembleia Geral «reitera sua exigência de que a Federação Russa retire imediata, completa e incondicionalmente todas as suas forças militares do território da Ucrânia e pede a cessação das hostilidades». 

    V. «UN General Assembly Calls for Inmediate End to War in Ukraine», 23/2/2023, disponível em <news.un.org/en/story/2023/02/1133847>.

  • 16.

    K. Roth: «How Putin and Xi Are Trying to Break Global Human Rights» em Foreign Policy, 27/10/2022. 

  • 17.

    Wang Yi: «A People-Centered Approach for Global Human Rights Progress», discurso no segmento de sessões de alto nível do 46º período de sessões do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, Genebra, 22/2/2021, disponível em <geneva.china-mission.gov.cn/eng/dbdt/202102/t20210222_9899531.htm>.

  • 18.

    Por exemplo, de acordo com a mídia estatal russa, os crimes de guerra em Bucha (Ucrânia) teriam sido supostamente cometidos por forças ucranianas contra seu próprio povo. 

  • 19.

    Em 2020, o NAFTA foi substituído pelo United States-Mexico-Canada Agreement (USMCA).

  • 21.

    Os países fundadores do Mercosul, em 1991, foram Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. A Venezuela foi aceita como membro pleno do bloco, mas foi suspensa em 2017. Os países associados são atualmente Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Guiana, Peru e Suriname.

  • 22.

    A sucessora de Lula, Dilma Rousseff (2011-2016), teve muito menos interesse na política internacional. Amorim tornou-se ministro da Defesa, e o papel de Marco Aurélio Garcia foi bastante reduzido. MAG, como muitos o chamavam, faleceu em 2017.

  • 23.

    Com relação à invasão do Iraque e da Ucrânia, é interessante notar que há quase um século, na Conferência Pan-Americana de 1928, em Havana, os 21 países participantes adotaram por unanimidade uma resolução afirmando que «a guerra de agressão constitui um crime internacional contra a espécie humana». «Panel II: Comparative Analysis of International and National Tribunals» em NYLS Journal of Human Rights vol. 12 N° 3, artigo 3, p. 549, disponível em <digitalcommons.nyls.edu/journal_of_human_rights/vol12/iss3/3>.

  • 24.

    G. Summa: «La tercera vez de Lula en un Brasil partido en dos» em Nueva Sociedad Nº 302, 11-12/2022, disponível em <nuso.org>.

  • 25.

    Luiz Inácio Lula da Silva: «Quelle place pur le Brésil dans de monde de demain?», conferência na Universidade Sciences Po, Paris, 16/11/2011, vídeo disponível em <youtube.com/watch?v=TmA8hRwJfTs>.

  • 26.

    No terceiro governo de Lula, Amorim atua como assessor especial do presidente, enquanto o ministro das Relações Exteriores é um diplomata de carreira, Mauro Viera, que ocupou o mesmo cargo, sem muito destaque, nos dois últimos anos de Dilma. O que falta a Lula hoje é um braço direito que, como MAG em seu tempo, tenha um conhecimento profundo da esquerda latino-americana e europeia e que possa se movimentar facilmente entre a diplomacia, os movimentos sociais e o mundo acadêmico e intelectual.

  • 27.

    Juan Pablo Álvarez: «Latin America’s Contribution to Global GDP Declines by One-Third over the Past Decade» em Bloomberg, 22/9/2022.

  • 28.

    C. Fortín, J. Heine e C. Ominami: «El no alineamiento activo: un camino para América Latina» em Nueva Sociedad edição digital, 9/2020, disponível em <nuso.org>. O conceito foi ampliado em um livro com curadoria dos mesmos autores: El no alineamiento activo y América Latina – Una doctrina para el nuevo siglo, Catalonia, Santiago, 2021. 

  • 29.

    Kai Ambos: «Latin American and International Criminal Law: Introduction and General Overview» em International Criminal Law Review vol. 10, 2010.

  • 30.

    Em 18 de agosto de 2018, o então candidato à Presidência Jair Bolsonaro disse que, se eleito, retiraria o Brasil do Conselho de Direitos Humanos da ONU porque «é um ponto de encontro de comunistas... sempre do lado de tudo que não é bom». Alguns dias depois, em 31 de agosto, o governo nicaraguense expulsou uma equipe do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos. Dois dias antes, a agência havia publicado um relatório culpando o regime de Daniel Ortega pela violenta repressão às manifestações de protesto, que causaram mais de 300 vítimas.

Este artículo es copia fiel del publicado en la revista Nueva Sociedad 305, Mayo - Junio 2023, ISSN: 0251-3552


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