Tema central
NUSO Nº Novembro 2015

Sobre o trabalho de cuidado de idosos e os limites do marxismo

Sobre o trabalho de cuidado de idosos e os limites do marxismo

Nota: Este artigo, escrito em 2009, é parte integrante do livro Revolución en punto cero. Trabajo doméstico, reproducción y luchas feministas (Traficantes de Sueños, Madri, 2013). Tradução de Car- men Carballal. Uma versão deste artigo em espanhol foi publicada em Nueva Sociedad No 256, 3-4/2015, disponível em www.nuso.org.

Introdução

O «trabalho de cuidados», especialmente no que se refere ao cuidado de idosos, situou-se nos últimos anos no centro da atenção pública nos países membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (ocde) como resposta às correntes que provocaram a crise de numerosas formas de assistência e cuidados. A primeira destas tendências foi e é o aumento, em termos absolutos e relativos, da população idosa e da expectativa de vida que, no entanto, não significou o aumento dos serviços de assistência aos idosos1. Também ocorreu um aumento significativo no número de mulheres empregadas de forma assalariada fora de casa, o que provocou uma redução da contribuição destas para a reprodução de suas famílias2. Devemos somar a estes fatores o contínuo processo de gentrificação e urbanização das áreas proletárias, que destruiu as redes sociais e os diversos modelos de apoio mútuo nos quais as pessoas idosas que moravam sozinhas podiam confiar, já que elas contavam com os vizinhos para fornecer-lhes alimentos, ajudá-las com as tarefas domésticas, visitá-las para conversar, etc. Como resultado destas tendências, para um grande número de pessoas idosas os efeitos positivos do aumento da expectativa de vida perderam o seu significado, e elas inclusive se sentem aterrorizadas pela perspectiva da solidão, da exclusão social e do aumento da vulnerabilidade diante dos abusos físicos e psíquicos. Tendo isto em mente, neste artigo refletimos sobre o tipo de ações que podem ser adotadas e por que a questão do cuidado dos idosos está totalmente ausente da literatura da esquerda radical.

O principal objetivo desta análise é lançar um apelo à redistribuição da riqueza social, redirecionando-a para o cuidado de idosos e para a construção de formas coletivas de reprodução social, que permitam fornecer esse cuidado, assim como o atendimento às suas necessidades, uma vez que as pessoas idosas não são mais capazes de fazê-lo por si mesmas e que isto não é feito em detrimento da qualidade de vida dos seus cuidadores. Para que isto aconteça, o trabalho de cuidado de pessoas idosas deve adquirir uma dimensão política e se posicionar dentro da agenda dos movimentos pela justiça social. Também é indispensável uma revolução cultural no conceito de velhice, contra a degradada representação que se tem deste setor, que, por um lado, é equiparado a uma carga fiscal para o Estado e, por outro, age-se como se o envelhecimento fosse um aspecto «opcional» da vida, que podemos superar e inclusive evitar adotando as tecnologias médicas adequadas, assim como os produtos «que aumentam a expectativa de vida» desenvolvidos pelo mercado3. Na politização do cuidado de idosos está em jogo não somente o destino destes, mas também a insustentabilidade dos movimentos radicais, que cometem um grave erro ao ignorar esta questão crucial para a possibilidade de criar uma solidariedade geracional e de classe. Trata-se de uma solidariedade que durante anos esteve na mira de uma inesgotável campanha contrária feita por economistas políticos e governos que identificaram os orçamentos destinados a estes trabalhadores – que recebem, devido à sua idade, pensões e diferentes tipos de subsídios sociais – como bombas-relógio econômicas e uma pesada hipoteca para o futuro dos jovens.

A crise do cuidado de idosos na era global

Em muitos aspectos, a atual crise do trabalho de cuidado de idosos não é uma novidade. Este trabalho sempre manteve uma constante situação de crise dentro da sociedade capitalista, devido tanto à desvalorização sofrida pelo trabalho reprodutivo no mundo capitalista como à visão que se tem das pessoas idosas como seres improdutivos e não como depositárias da memória coletiva e da experiência, tal como eram consideradas nas sociedades pré-capitalistas. Em outras palavras, o trabalho de cuidado de idosos sofre uma dupla desvalorização cultural e social. Da mesma forma que o restante do trabalho reprodutivo, este não é reconhecido como trabalho. Ao contrário do que acontece com a reprodução da força de trabalho, cujo produto tem um valor reconhecido, o cuidado de idosos é estigmatizado como uma atividade que absorve valor, mas não o gera. Por isso, os orçamentos destinados ao cuidado de idosos tradicionalmente foram desembolsados sob um discurso mesquinho que lembra aquele anunciado pelas leis de pobreza do século xix: as tarefas de cuidado dos idosos que não são mais capazes de cuidar de si mesmos ficam, assim, nas mãos das famílias e dos parentes, com escasso apoio externo, na presunção de que as mulheres devem assumir esta tarefa de forma natural como parte do seu trabalho doméstico.

Foi necessária uma longa e intensa luta para obrigar o capital a reproduzir não somente a força de trabalho «em uso», mas todo o necessário para a reprodução da classe trabalhadora ao longo de todo o seu ciclo vital, incluindo a prestação de assistência para aqueles que não fazem mais parte do mercado de trabalho. Entretanto, nem mesmo o Estado keynesiano atingiu este objetivo. Exemplo desta falta de visão é a legislação sobre a previdência social aprovada nos Estados Unidos em 1940 e festejada como «uma das conquistas do nosso século», que respondia apenas parcialmente aos problemas enfrentados pelos idosos, já que vinculava o dinheiro recebido do Estado aos anos de trabalho remunerado e proporcionava ajuda social somente aos idosos em situação de extrema pobreza4.

O triunfo do neoliberalismo agravou esta situação. Em alguns países da ocde, durante os anos 90 foram dados os passos necessários para o aumento do financiamento dos serviços de cuidados domiciliares e para proporcionar formação e benefícios aos cuidadores5. Na Grã-Bretanha, o governo aprovou o direito dos cuidadores a exigir dos empresários jornadas de trabalho flexíveis, para então poder «conciliar» trabalho assalariado e trabalho de cuidados6. Mas o desmantelamento do Estado de Bem-Estar e a insistência neoliberal em que a reprodução é responsabilidade pessoal dos trabalhadores dispararam uma tendência oposta que está ganhando velocidade e que a atual crise econômica sem dúvida acelerará.

A redução dos orçamentos sociais destinados aos idosos foi especialmente severa nos eua, onde chegou ao extremo de que os trabalhadores têm, com frequência, um empobrecimento em sua situação econômica quando assumem o cuidado dos familiares dependentes. A transferência de grande parte dos cuidados hospitalares para os domicílios, tendência política em auge, aumentou os problemas destas famílias, já que, motivada meramente por motivos financeiros, está sendo realizada sem nenhum tipo de consideração pelas estruturas necessárias para a substituição dos serviços que habitualmente são fornecidos pelos hospitais. Tal como descrito por Nona Glazer, este desenvolvimento não só aumentou a quantidade de trabalho que os membros da família, majoritariamente mulheres, devem realizar7, como também transferiu para o domicílio operações «perigosas» e até «com risco para a vida» que no passado somente se podia esperar que fossem realizadas por enfermeiras formadas e em hospitais8. Paralelamente, os trabalhadores de cuidados domésticos tiveram a sua carga de trabalho duplicada e a duração das visitas foi reduzida9, obrigando-os a limitar seus serviços à «manutenção da casa e ao cuidado corporal»10. Os centros de cuidado financiados pelo Estado também foram «taylorizados», «por meio do uso de time-and-motion-studies [estudos de racionalização do tempo de trabalho e movimentos] para decidir quantos pacientes se espera que sejam atendidos»11.

A globalização do cuidado de idosos durante as décadas de 1980 e 1990 não resolveu esta problemática. A nova divisão internacional do trabalho reprodutivo promovida pela globalização transferiu grandes quantidades de trabalho para as costas das mulheres imigrantes. Este desenvolvimento foi muito benéfico para os governos, já que permite que eles economizem bilhões de dólares que, de outra forma, teriam que pagar para proporcionar serviços de assistência aos idosos. Também permitiu que muitas pessoas idosas que queriam manter sua independência e permanecer em seus domicílios o fizessem sem ir à falência. Mas esta não pode ser considerada uma «solução» para o cuidado dos idosos na falta de uma transformação social e econômica das condições dos trabalhadores de cuidados e dos fatores que motivam sua «escolha» por este trabalho. O impacto destruidor da «liberalização econômica» e dos «ajustes estruturais» em seus países de origem é o motivo pelo qual milhões de mulheres da África, Ásia, ilhas do Caribe e dos antigos países socialistas migram para as regiões mais ricas da Europa, Oriente Médio e eua para servir como babás, trabalhadoras domésticas e cuidadoras de idosos. Para fazê-lo, devem abandonar suas próprias famílias, incluindo crianças e progenitores idosos, e empregar familiares ou outras mulheres com ainda menos recursos e capacidade econômica que elas para substituí-las em tarefas que não podem mais realizar12. Se tomarmos como exemplo o caso da Itália, calcula-se que três de cada quatro badanti (como são chamadas as cuidadoras de idosos) têm filhos, mas somente 15% têm suas famílias com elas13. Isto significa que a maior parte destas mulheres sofrem fortes estados de ansiedade, enfrentando o fato de que suas próprias famílias têm que passar sem o cuidado que elas mesmas proporcionam a outras pessoas em todo o mundo. Arlie Hochschild fala, neste contexto, de «transferência global do cuidado e das emoções» e da formação de uma «cadeia global de cuidados»14. Porém, alguns elos dessa cadeia frequentemente se rompem: as mulheres imigrantes se tornam desconhecidas para os próprios filhos, os acordos estipulados são quebrados e os familiares podem morrer durante a sua ausência.

Não menos importante é que, devido à desvalorização do trabalho reprodutivo e ao fato de que são imigrantes, frequentemente sem documentação em ordem, e mulheres negras, as trabalhadoras assalariadas são muito vulneráveis diante de um amplo leque de chantagens e abusos: longas jornadas de trabalho, férias não remuneradas e sem qualquer benefício, expostas a comportamentos racistas e abusos sexuais. O salário das trabalhadoras de cuidados nos eua é tão mínimo que pelo menos a metade delas dependem dos vales de alimentação e de diferentes tipos de ajudas sociais para chegar até o fim do mês15. De fato, como destacou a Domestic Workers Union – principal organização de trabalhadoras domésticas e de cuidados do estado de Nova Iorque e promotora da Carta de Direitos das Trabalhadoras Domésticas [DomesticWorkers Bill of Rights] – as trabalhadoras de cuidados vivem e trabalham «em condições análogas à escravidão»16.

Também é importante destacar que a maior parte das pessoas idosas e suas famílias não podem contratar cuidadoras pagando pelos serviços com salários que realmente atenderiam às suas necessidades. Isto é especialmente verdadeiro no caso de pessoas idosas dependentes que necessitam de cuidados durante todo o dia. Conforme as estatísticas do Conselho Nacional de Economia e Trabalho de 2003, na Itália, somente 2,8% dos idosos recebem assistência não familiar em sua residência; na França, a porcentagem é o dobro e, na Alemanha, o triplo17. Mas essa cifra ainda é muito baixa. Muitas pessoas idosas moram sozinhas, enfrentando dificuldades que são ainda mais devastadoras quanto mais invisíveis elas forem. Durante o «verão quente» de 2003, milhares de pessoas morreram em toda a Europa por desidratação, falta de comida e medicamentos, ou simplesmente pelo calor insuportável. Morreram tantas pessoas idosas em Paris que as autoridades tiveram que armazenar seus corpos em espaços públicos refrigerados até que suas famílias pudessem reivindicá-los.

Quando são os membros das famílias que cuidam dos idosos, as tarefas costumam recair em grande medida sobre as costas das mulheres18, que durante meses, e às vezes anos, vivem no limite do esgotamento físico e mental, consumidas pelo trabalho e pela responsabilidade de ter que proporcionar cuidados e realizar tarefas para as quais frequentemente não estão preparadas. Muitas têm trabalhos fora de casa que frequentemente são forçadas a abandonar quando aumenta o trabalho de cuidados. As mulheres pertencentes à «geração sanduíche» estão particularmente estressadas, já que devem criar os seus filhos ao mesmo tempo em que cuidam de seus pais19. A crise do trabalho de cuidados chegou a tal ponto que, nos eua, em famílias de baixa renda e/ou monoparentais, adolescentes e crianças, às vezes com não mais de 11 anos, administram terapias e injeções aos idosos. Como informou o The New York Times, um estudo de abrangência nacional realizado durante 2005 revelou que «3% dos lares com crianças de entre 8 e 18 anos incluem crianças cuidadoras»20.

A alternativa para aqueles que não podem pagar nenhum tipo de «cuidado assistencial» são as residências públicas ou os centros em que os idosos passam o dia. De qualquer modo, mais parecem prisões do que residências para idosos. Frequentemente, devido à falta de pessoal e de recursos econômicos, estas instituições costumam proporcionar cuidados mínimos. Na maior parte dos casos, deixam os residentes durante muitas horas deitados na cama sem ninguém por perto para trocá-los de posição, acomodá-los e colocar-lhes travesseiros, massagear suas pernas, cuidar das feridas provocadas pelas longas horas deitados ou, simplesmente, conversar com eles, elementos básicos para manter o seu sentimento de identidade e dignidade e conservar o sentimento de vitalidade e a sensação de serem valorizados. Nos piores casos, as residências são lugares onde as pessoas idosas são mantidas sedadas, amarradas à cama, deixadas dormindo sobre seus excrementos, sujeitas a todo tipo de abusos psicológicos e físicos. Grande parte desta realidade foi revelada pelos diferentes estudos, incluindo um do governo dos eua de 2008, que relatam histórias de abusos, negligência e violações às normas de saúde e segurança, em 94% das residências21. A situação não é mais animadora em outros países. Na Itália, as denúncias de abusos cometidos contra pessoas com deficiência ou doentes crônicos são muito frequentes, assim como os casos nos quais lhes é negada a assistência médica necessária22.

O cuidado de idosos, os sindicatos e a esquerda

Os problemas descritos são tão comuns e urgentes que se poderia supor que ocupam um lugar proeminente na agenda política dos movimentos pela justiça social e dos sindicatos em escala internacional. Entretanto, não é o que acontece. A não ser que trabalhem dentro de alguma instituição, como é o caso das enfermeiras e auxiliares, as trabalhadoras de cuidados são ignoradas pelos sindicatos, inclusive pelos mais combativos, como é o caso do Congress of South African Trade Unions (cosatu)23.

Os sindicatos negociam as pensões, as condições econômicas da aposentadoria e da assistência à saúde, mas falam pouco em seus programas sobre os sistemas de apoio necessários às pessoas que estão envelhecendo ou sobre as necessidades das trabalhadoras de cuidados, remuneradas ou não. Nos eua, até há pouquíssimo tempo, os sindicatos nem sequer haviam tentado organizar as trabalhadoras de cuidados, menos ainda se fossem trabalhadoras não remuneradas. Por isso, até hoje os trabalhadores de cuidados que trabalham para indivíduos ou famílias estão excluídos da Lei das Normas Trabalhistas Justas (Fair Labor Standards Act), legislação que data dos tempos do New Deal e que garante o «acesso ao salário mínimo, às horas extras, à negociação de direitos e a outros direitos trabalhistas»24. Como já mencionado, dos 50 estados, somente o de Nova Iorque reconheceu até agora as trabalhadoras de cuidados como trabalhadoras, com a aprovação, em novembro de 2010, da Carta de Direitos pela qual o Sindicato das Trabalhadoras Domésticas havia lutado longamente. Mas os eua não são um caso isolado. Conforme um relatório da Organização Internacional do Trabalho (oit) realizado em 2004, «os índices de sindicalização transnacional dentro do setor doméstico quase não chegam a 1%»25. As pensões também não são algo comum para todas as trabalhadoras, somente para aquelas que trabalharam em troca de um salário, e não são um direito reconhecido aos familiares cuidadores não remunerados. Como o trabalho de cuidados não é um trabalho reconhecido como tal, e o sistema de pensões computa sua retribuição em função dos anos de contribuição conforme uma base assalariada, as mulheres que trabalharam como donas de casa em período integral com frequência somente podem obter uma pensão dependente de um marido assalariado e não têm direito a benefícios da previdência social em caso de divórcio. As organizações sindicais não enfrentaram estas desigualdades, nem os movimentos sociais e nem as organizações marxistas, que, apesar de algumas exceções, parecem ter apagado os idosos das lutas, a julgar pela ausência de qualquer referência a estes nas análises marxistas atuais. A responsabilidade por este estado de coisas pode remontar ao próprio Karl Marx. O cuidado de idosos não é algo considerado em sua obra, apesar de que a questão dos idosos esteve dentro da agenda política revolucionária desde o século xviii e as sociedades baseadas no apoio mútuo e nas visões utópicas de comunidades recriadas abundaram em sua época (fourieristas, owenistas, icarianos)26.

Marx estava preocupado em entender os mecanismos da produção capitalista, as diferentes formas ou caminhos que a classe operária toma para enfrentá-la e as diferentes formas adotadas por suas lutas. O desenvolvimento do seu pensamento não abrangia a segurança na terceira idade nem o cuidado de idosos. Se dermos credibilidade aos relatórios dos contemporâneos de Marx, chegar à velhice era algo estranho entre os trabalhadores fabris e mineiros da época, cuja expectativa média de vida, em zonas industriais como Manchester e Liverpool, não superava 30 anos27. O mais importante é que Marx não reconheceu a centralidade do trabalho reprodutivo na acumulação capitalista nem na construção da nova sociedade comunista. Embora tanto ele como Friedrich Engels tenham escrito sobre a dramática situação na qual viviam e trabalhavam os operários ingleses, Marx praticamente naturalizou o processo reprodutivo sem nem sequer esboçar ou vislumbrar como deveria ser sua reorganização em uma sociedade pós-capitalista e/ou durante o próprio desenvolvimento da luta. Por exemplo, Marx descrevia o processo de «cooperação» somente dentro do processo de produção de mercadorias, ignorando as formas qualitativamente diferentes de cooperação proletárias dentro dos processos de reprodução que mais tarde Piotr Kropotkin denominaria como «apoio mútuo»28.

A cooperação entre trabalhadores é, para Marx, um atributo fundamental da organização do trabalho capitalista, «simples resultado do capital que os emprega simultaneamente», e que ocorre somente quando os trabalhadores «já deixaram de pertencer a si mesmos» e são funcionais apenas para o aumento da produtividade e da eficácia profissional29. Como tais, não deixam espaço para as habituais expressões de solidariedade e para as muitas «instituições e hábitos de ajuda mútua» «grêmios, sociedades, irmandades» – que Kropotkin verificava que estavam presentes nas diferentes populações industriais da sua época30. Tal como Kropotkin percebeu, estas mesmas formas de apoio mútuo limitavam os efeitos e o poder do capital e do Estado sobre as vidas dos trabalhadores, evitando que inúmeros trabalhadores caíssem em uma ruína mais profunda e plantando as sementes de um sistema de seguro médico autogerido, que garantia certo tipo de proteção contra o desemprego, a doença, a velhice e a morte31.

Típica dos limites da perspectiva marxista é a sua visão utópica expressada em «Fragmento sobre as máquinas», que faz parte dos Grundrisse (1857-1858), onde Marx projeta um mundo no qual as máquinas se encarregam de todas as tarefas e os seres humanos somente as observam, funcionando como seus supervisores. Esta visão omite que, inclusive nos países mais avançados, grande parte do trabalho socialmente necessário consiste nas atividades reprodutivas e que este trabalho demonstrou ser irredutível à mecanização.

As necessidades, os desejos e as capacidades dos idosos, ou das pessoas sem salário, somente podem ser minimamente considerados mediante a introdução de tecnologias. A automação do cuidado de idosos já é um caminho bem desenvolvido. Como demonstrou Nancy Folbre (a mais importante economista e teórica do cuidado de idosos dos eua), as indústrias japonesas já estão bastante avançadas na tentativa de tecnologizar este tipo de cuidados, como também estão, de forma geral, na produção de robôs interativos. Os robôs enfermeiros que dão banho nas pessoas ou que «passeiam com elas para exercitá-las» e os «robôs de acompanhamento» (cães robôs, ursinhos robóticos) já estão no mercado, embora a um custo proibitivo32. Também sabemos que para muitas pessoas idosas os televisores e os computadores pessoais se tornaram badantis substitutas. As cadeiras de rodas elétricas dirigidas eletronicamente melhoram a mobilidade daqueles que têm capacidade suficiente de controle dos seus próprios movimentos para dirigir os comandos.

Estes desenvolvimentos científicos e tecnológicos podem beneficiar em grande medida as pessoas idosas se forem economicamente acessíveis. A circulação do conhecimento que proporcionam de fato coloca grande quantidade de riqueza em suas mãos. Mas isto não pode substituir o trabalho dos cuidadores, especialmente no caso das pessoas que moram sozinhas e das que sofrem doenças ou deficiências. Como aponta Folbre, a companhia robótica poderia até aumentar a solidão e o isolamento destas pessoas33. Nenhum automatismo pode dar conta dos sentimentos – medo, ansiedade, perda de identidade e da própria dignidade – que as pessoas experimentam quando envelhecem e passam a depender de outros para satisfazer suas necessidades mais básicas.

Não é de inovação tecnológica que se precisa para enfrentar a questão do cuidado de idosos, mas sim uma mudança nas relações sociais, por meio da qual a valorização econômica deixe de ser o motor da atividade social e impulsione a reprodução social como um processo coletivo. De qualquer modo, isto não pode ocorrer dentro de um contexto de trabalho marxista, carente de uma revisão ampla do significado do trabalho similar àquela proposta pelas feministas durante os anos 70, como parte dos debates políticos sobre a função do trabalho doméstico e a origem da discriminação de gênero. As feministas rejeitaram a centralidade que o marxismo atribuiu historicamente ao trabalho assalariado e à produção de mercadorias como locais cruciais na transformação social, e criticaram a negligência mostrada na hora de levar em conta a reprodução dos seres humanos e da força de trabalho. A contribuição do movimento feminista foi ter mostrado não somente que a reprodução é o pilar central da «indústria social», como também é na mudança das condições sob as quais nos reproduzimos que reside o elemento essencial da nossa capacidade para criar «movimentos que se (auto) reproduzam»34. Ignorar que o «pessoal» é «político» enfraquece em grande medida a força das nossas lutas.

Nesta questão, os marxistas atuais não avançaram muito mais do que o próprio Marx. Se tomarmos como exemplo a teoria marxista da autonomia do «trabalho imaterial afetivo», observamos como ela ainda ignora a profusa problemática que a análise feminista sobre o desenvolvimento reprodutivo colocou em evidência35. A teoria do «trabalho imaterial afetivo» afirma que, na fase atual do capitalismo, a distinção entre produção e reprodução é totalmente imprecisa, já que o trabalho se transformou na produção dos estados do ser, dos «afetos» e do «imaterial», mais do que de objetos físicos36. Neste sentido, o «trabalho afetivo» seria mais um componente de todas e cada uma das formas de trabalho, mais que de um tipo determinado de (re)produção. O exemplo que habitualmente se dá sobre «trabalhadores afetivos» ideais são as mulheres trabalhadoras dos estabelecimentos de fast-food, que devem virar os hambúrgueres do McDonald’s com um sorriso, ou a aeromoça que deve vender uma sensação de segurança às pessoas às quais atende. Entretanto, este tipo de exemplo é enganoso, já que grande parte do trabalho reprodutivo, como por exemplo o cuidado de idosos, necessita um compromisso total com as pessoas reproduzidas, uma relação que dificilmente pode ser concebida como «imaterial».

Ainda assim, é importante reconhecer que o conceito de «trabalho de cuidados» também é, até certo ponto, reducionista. A expressão se integrou ao idioma corrente durante as décadas de 1980 e 1990, juntamente com o surgimento de um novo tipo de divisão do trabalho dentro do trabalho reprodutivo, que contempla os aspectos físicos e emocionais de forma separada. As trabalhadoras de cuidados remuneradas se aferraram a esta distinção em busca de especificação das tarefas que seus empregadores podem esperar ou demandar delas e de reconhecimento do seu trabalho como qualificado. Mas esta distinção é insustentável, tal como elas mesmas devem reconhecer. Porque o que diferencia a reprodução dos seres humanos da produção de mercadorias é o caráter holístico de muitas das tarefas envolvidas na reprodução. De fato, ao introduzir uma separação, mergulhamos em um mundo de alienação radical, já que as pessoas idosas (ou crianças, em muitos casos) seriam alimentadas, lavadas, penteadas, massageadas ou medicadas sem qualquer consideração por seu estado emocional, sua resposta «afetiva» e estado geral de bem-estar. A teoria do «trabalho afetivo» ignora esta problemática, assim como a complexidade compreendida na reprodução da vida. Também sugere que todas as formas de trabalho no capitalismo «pós-industrial» estão cada vez mais homogeneizadas37. Entretanto, uma olhada na organização do cuidado de idosos, tal como está constituído hoje em dia, dissipa essa ilusão.

Mulheres, velhice e cuidado de idosos sob a perspectiva das economistas feministas

Tal como afirmaram as economistas feministas, a crise do cuidado de idosos, seja do ponto de vista dos idosos ou das cuidadoras, implica essencialmente em uma questão de gênero. Embora este trabalho esteja cada vez mais mercantilizado, a maior parte dele é realizada por mulheres e geralmente em forma de trabalho não remunerado, o que não lhes dá direito a nenhum tipo de pensão ou ajuda econômica social. Por isto, paradoxalmente, quanto mais as mulheres cuidam dos outros, menos elas próprias recebem como contraprestação, já que dedicam menos tempo ao trabalho assalariado do que os homens, e grande parte dos sistemas de previdência social são calculados em função dos anos efetivos de trabalho remunerado. As trabalhadoras de cuidados, que fazem parte de uma «subclasse» que hoje em dia ainda tem que lutar para ser reconhecida como trabalhadora, também são afetadas pela desvalorização do trabalho reprodutivo. Em resumo, devido à desvalorização do trabalho reprodutivo, quase todas as mulheres enfrentam o envelhecimento com menos recursos que os homens, medido em termos de apoio familiar, renda econômica e bens disponíveis. Nos eua, onde as pensões e a previdência social são quantificadas em função dos anos dedicados ao trabalho assalariado, as mulheres formam o setor mais amplo de pobres e o maior número de habitantes das residências subvencionadas para pessoas com baixa renda, autênticos campos de concentração dos nossos dias, justamente porque investiram tanto tempo de suas vidas fora da força de trabalho assalariada, em atividades não reconhecidas como trabalho.

A ciência e a tecnologia não podem resolver este problema. É necessária uma transformação na divisão social e sexual do trabalho e, acima de tudo, o reconhecimento do trabalho reprodutivo como trabalho, o que permitiria às mulheres exigir um salário por estas tarefas e, por sua vez, facilitaria que os familiares que trabalham como cuidadores não sejam penalizados social nem economicamente por seu trabalho38. O reconhecimento e a valorização do trabalho reprodutivo também são indispensáveis para a superação das divisões existentes dentro do trabalho de cuidados, divisões estas enfrentadas, por um lado, pelos familiares que tentam minimizar seus gastos e, por outro, pelas trabalhadoras de cuidados empregadas que sofrem as desmoralizantes consequências de trabalhar no limite da pobreza e da desvalorização do seu trabalho.

As economistas feministas que trabalham neste campo articularam possíveis alternativas aos sistemas atuais. Em Warm Hands in Cold Age, Nancy Folbre, Lois B. Shaw e Agneta Stark desenvolvem e argumentam as reformas necessárias para proporcionar segurança à população em fase de envelhecimento, especialmente as mulheres idosas, por meio do posicionamento de uma perspectiva internacional e avaliando os países líderes neste assunto39. A classificação entre as nações desenvolvidas é encabeçada pelos países escandinavos, que proporcionam um sistema de previdência social quase universal. No final da classificação, estão os eua e a Inglaterra, países nos quais a assistência aos idosos está ligada à vida profissional assalariada. Mas, em ambos os casos, existe um problema na forma como essas políticas estão desenhadas, já que refletem uma divisão sexual do trabalho desigual, assim como as expectativas tradicionais concernentes aos papéis das mulheres na família e na sociedade. Esta é a área crucial na qual deve ocorrer a mudança.

Folbre também defende a redistribuição dos recursos a partir do complexo militar-industrial e de outras empresas destrutivas para o cuidado das pessoas idosas. Reconhece que isto pode parecer «ingênuo» e equivalente a uma chamada à revolução. Mas insiste que deveria ser colocado em «nossa pauta», já que o que está em jogo é o futuro de todos os trabalhadores, sem esquecer que uma sociedade cega diante do tremendo sofrimento que espera por muitas pessoas ao chegarem à velhice, como no caso dos eua hoje em dia, que é uma sociedade destinada à autodestruição.

De qualquer modo, não há nenhum sinal de que esta cegueira se dissipará em breve. Em nome da crise econômica, os formuladores de políticas afastam o olhar desta problemática, brandindo sempre a ameaça de reduzir o gasto social e cortar as pensões estatais e os sistemas de previdência social que incluem os subsídios ao trabalho de cuidados. A ladainha repetida uma e outra vez é a obsessiva queixa sobre a obstinação de uma população envelhecida, porém mais vital e energética, que se empenhou em viver mais tempo e que está provocando a insustentabilidade dos orçamentos destinados às pensões públicas. É possível que Alan Greenspan tivesse em mente os milhões de norte-americanos que decidiram viver mais que 80 anos quando se assustou, como confessa em suas memórias, ao perceber que o governo de Bill Clinton havia, de fato, acumulado um superávit econômico40. Apesar de tudo, inclusive antes da crise, os formuladores de políticas estavam orquestrando havia anos uma guerra geracional, alertando incessantemente sobre a falência da previdência social à qual leva o crescimento da população com mais de 65 anos, legando uma hipoteca mortal às gerações jovens. Agora, em um momento no qual a crise se torna mais profunda, o assalto ao orçamento destinado à assistência e ao cuidado das pessoas idosas está destinado a aumentar, seja pela hiperinflação que está dizimando a renda fixa, pela privatização parcial do sistema da previdência social ou pelo aumento da idade de aposentadoria. A verdade é que não há ninguém que esteja exigindo um aumento no gasto com o cuidado de idosos41. Por isso, é necessário que os movimentos pela justiça social, incluindo os ativistas e pensadores radicais, intervenham neste campo para evitar um tipo de soluções para a crise em detrimento dos idosos e para formular iniciativas capazes de reunir os diferentes sujeitos sociais implicados na questão do cuidado de idosos – trabalhadoras de cuidados, famílias dos idosos e, sobretudo, os próprios idosos – que hoje em dia estão situados em posições antagonistas. Já existem exemplos deste tipo de parcerias em algumas das lutas que ocorrem em relação ao cuidado dos idosos, nas quais as enfermeiras e os pacientes, as trabalhadoras de cuidados assalariadas e as famílias dos seus clientes, aliam-se para confrontar em conjunto o Estado, conscientes de que, quando as relações de reprodução se tornam antagonistas, quem paga o preço são os produtores e os reproduzidos.

Enquanto isso, também está a caminho a «produção dos comuns» (commoning) no campo do trabalho reprodutivo e de cuidados. Por exemplo, em algumas cidades italianas já estão sendo desenvolvidos modelos de vida em comunidade baseados em «contratos solidários» promovidos por pessoas idosas que, para evitar serem institucionalizadas, agrupam seus esforços e recursos quando não podem contar com suas famílias ou contratar um cuidador. Nos eua, as «comunidades de cuidados» são formadas por gerações mais jovens de ativistas políticos, que aspiram socializar e coletivizar a experiência da doença, da dor, do sofrimento e do «trabalho de cuidados» envolvida nestas experiências, começando a reclamar e redefinir neste processo o que significa adoecer, envelhecer, morrer42. Estes esforços devem se expandir. São essenciais para a reorganização da nossa cotidianidade e a criação de relações sociais de não exploração. Como as sementes de um novo mundo não serão plantadas online, pois somente através da cooperação poderemos nos desenvolver e reproduzir nossos movimentos, esta cooperação e reprodução devem começar por aqueles de nós que enfrentam os momentos de maior vulnerabilidade de nossas vidas sem os recursos e a ajuda de que precisam, o que pressupõe uma forma oculta, porém indiscutível, de tortura em nossa sociedade.

  • 1.

    Laurence J. Kotlikoff e Scott Burns: The Coming Generational Storm: What You Need to Know About America’s Economic Future, mit Press, Cambridge, 2004.

  • 2.

    Nancy Folbre: «Nursebots to the Rescue? Inmigration, Automation and Care» em Globalizations vol. 3 No 3, 2006, p. 350.

  • 3.

    Tal como afirmam Kelly Joyce e Laura Mamo, comandada pela busca de benefícios e por uma ideologia que privilegia a juventude, foi desenvolvida uma ampla campanha cujo objetivo é garantir um nicho de mercado propício para transformar os idosos em consumidores, prometendo «regenerar» os seus corpos e atrasar o envelhecimento desde que eles utilizem os produtos e as tecnologias farmacêuticas adequados. Neste contexto, o envelhecimento se tornou quase um pecado, que cometemos e anunciamos em primeira pessoa quando não utilizarmos os benefícios dos últimos produtos rejuvenescedores. K. Joyce e L. Mamo: «Graying the Cyborgs: New Directions in Feminist Analyses of Aging, Science, and Technology» em Toni M. Calasanti e Kathleen F. Slevin: Age Matters: Realigning Feminist Thinking, Routledge, Nova Iorque, 2006, pp. 99-122.

  • 4.

    Dora L. Costa: The Evolution of the Retirement: An American Economic History, 1880-1990, The University of Chicago Press, Chicago, 1998, p. 1.

  • 5.

    ocde Health Project: Long Term Care For Older People, ocde, Paris, 2005; Lourdes Benería: «The Crisis of Care, International Migration, and Public Policy» em Feminist Economics vol. 14 No 3, 7/2008, pp. 2-3 e 5.

  • 6.

    Na Inglaterra e Gales, onde se contabiliza um total de 5,2 milhões de pessoas como cuidadoras informais, desde abril de 2007 é reconhecido o direito dos cuidadores de adultos a exigir jornadas de trabalho flexíveis (ibid.). Na Escócia, o Community Care and Health Act de 2002 «introduziu cuidados pessoais gratuitos para idosos» e também redefiniu os cuidadores como «cotrabalhadores que recebem recursos, mais do que consumidores (...) que devam ser obrigados a pagar pelos serviços». Fiona Carmichael et al.: «Work Life Inbalance: Informal Care and Paid Employment» em Feminist Economics vol. 14 No 2, 4/2008, p. 7.

  • 7.

    N.Y. Glazer: Women’s Paid and Unpaid Labor: Work Transfer in Health Care and Retail, Tremble University Press, Filadélfia, 1993. Conforme diferentes enquetes, nos eua, como consequência destes cortes, de 20 a 50 milhões de pessoas proporcionam às suas famílias o cuidado que tradicionalmente era realizado por enfermeiras e trabalhadores sociais. Os cuidadores familiares suprem 80% dos cuidados de doentes e familiares dependentes, e a necessidade de seus serviços continuará crescendo devido ao aumento da expectativa de vida e aos avanços da medicina moderna, com a sua capacidade de prolongar a vida. Cada vez mais doentes terminais decidem permanecer em sua residência até que chegue seu fim; os membros da família e os amigos são aqueles que hoje atuam como cuidadores informais de cerca de três quartos dos doentes ou dos dependentes idosos vivendo em comunidade durante estes anos de sua vida, conforme um relatório dos Arquivos de Medicina Interna de janeiro de 2007; v. Jane E. Brody: «When Families Take Care of Their Own» em The New York Times, 11/11/2008.

  • 8.

    Como consequência desta «transferência», conforme descreve Glazer, o domicílio se tornou uma fábrica médica, na qual são feitas diálises e onde as donas de casa e seus apoios devem aprender a inserir cateteres e sondas; além disso, está sendo produzida toda uma nova classe de equipe médica para uso doméstico. N.Y. Glazer: op. cit., p. 154.

  • 9.

    Ibid., pp. 166-167 e 173-174.

  • 10.

    Eileen Boris e Jennifer Klein: «We Were the Invisible Workforce: Unionizing Home Care» em Dorothy Sue Cobble (ed.): The Sex of Class: Women Transforming American Labor, Cornell University Press, Ithaca, 2007, p. 180.

  • 11.

    N.Y. Glazer: op. cit., p. 174.

  • 12.

    Jean L. Pyle: «Transnational Migration and Gendered Care Work: Introduction» em Globalizations No 3, 2006, p. 289; Arlie Hochschild e Barbara Ehrenreich: Global Women: Nannies, Maids and Sex Workers in the New Economy, Holt, Nova Iorque, 2002.

  • 13.

    Dario Di Vico: «Le badanti, il nuovo welfare privato. Aiutano gli anziani e lo Stato risparma» em Corriere della Sera, 13/6/2004, p. 15.

  • 14.

    A. Hochschild: «Global Care Chains and Emotional Surplus Value» em W. Hutton e Anthony Giddens (eds.): Global Capitalism, The New Press, Nova Iorque, 2000; A. Hochschild e B. Ehrenreich: op. cit., pp. 26-27.

  • 15.

    Em The New York Times, 28/1/2009.

  • 16.

    A Carta de Direitos pela qual o sindicato das trabalhadoras domésticas e de cuidados lutou, aprovada em 2010 no estado de Nova Iorque, foi a primeira no país a reconhecer as trabalhadoras de cuidados como tais e que lhes reconheceu os mesmos direitos de outras categorias de trabalhadores.

  • 17.

    D. Di Vico: op. cit.

  • 18.

    De qualquer modo, conforme o The New York Times, o número de homens que cuidam de seus progenitores idosos cresceu de forma sustentada nos eua.

  • 19.

    Martin Beckford: «‘Sandwich Generation’: Families Torn Between Demands of Children and Parents» em The Telegraph, 1/4/2009.

  • 20.

    Pam Belluck: «In Turnabout, Children Take Caregiver Role» em The New York Times, 22/2/2009. Outros países nos quais as crianças passaram a ser trabalhadoras de cuidados são o Reino Unido e a Austrália, onde frequentemente é reconhecido o seu direito a participar dos «debates sobre o cuidado dos pacientes» e a exigir retribuições econômicas por seu trabalho.

  • 21.

    The New York Times, 30/8/2008.

  • 22.

    Sobre este tema, v. Francesco Santanera: «Violenze e abusi dovuti anche alla mancata applicazione delle leggi» em Prospettive Assistenziali Nº 169, 1-3/2010. O número 168 dessa mesma publicação é dedicado às lutas contra a exclusão social, especialmente os casos de pessoas portadoras de deficiências ou idosas.

  • 23.

    Shireen Ally: «Caring about Care Workers: Organizing in the Female Shadow of Globalization», trabalho apresentado na International Conference on Women and Globalization, Centro para la Justicia Global, San Miguel de Allende, México, 27 de julho a 3 de agosto de 2005, p. 3.

  • 24.

    E. Boris e J. Klein: op. cit., p. 182.

  • 25.

    S. Ally: op. cit., p. 1.

  • 26.

    Robin Blackburn: Banking on Death, or Investing in Life: The History and Future of the Pensions, Verso, Londres, 2002, p. 39-41; Charles Nordhoff: The Communistic Societies of the United States [1875], Schocken Books, Nova Iorque, 1965. Como afirma Blackburn, as primeiras propostas para o estabelecimento de um sistema de pensões para os idosos datam dos tempos da Revolução Francesa. Thomas Paine desenvolveu o debate na segunda parte de Os direitos do homem (1792), assim como fez seu amigo Nicolas de Condorcet, que propôs um sistema que cobrisse todos os cidadãos. Na esteira destas propostas, «A Convenção Nacional declarou o dia dez de Fructidor como a Fête de la Vieillesse [festa da velhice] e estabeleceu também a criação de residências para idosos em cada estado (...) A Convenção adotou o princípio de uma pensão cívica para os mais idosos em junho de 1794, apenas alguns meses após a abolição da escravatura» (R. Blackburn: op. cit., p. 40-41). Na época de Marx, as diferentes formas de retribuição durante períodos de doença, velhice e morte, assim como em caso de desemprego, eram cobertas pelas associações operárias, organizadas por grêmios e descritas, nas palavras de John Foster, como «a única instituição social que se preocupou e se encarregou da situação de grande parte dos adultos da classe trabalhadora» (J. Foster: Class Struggle and the Industrial Revolution, Weidenfeld & Nicolson, Londres, 1974, p. 216). Embora o auge do socialismo utópico tenha ocorrido durante a primeira parte do século xix, até pelo menos 1860 continuaram os experimentos comunitários, comprometidos com a proteção de seus membros diante da pobreza e da incapacidade decorrente da velhice, especialmente em lugares como os eua. O jornalista contemporâneo, Charles Nordhoff, contabilizou pelo menos 72 organizações que funcionavam conforme os princípios cooperativos/comunitários. Ver C. Nordhoff: op. cit.

  • 27.

    Wally Secombe: Weathering in the Storm: Working Class Families from the Industrial Revolution to the Fertility Decline, Verso, Londres, 1993, p. 75-77.

  • 28.

    Para saber mais sobre o conceito de Kropotkin sobre o apoio mútuo, v. em particular os dois últimos capítulos da obra homônima: Mutual Aid: A Factor of Evolution, Freedom Press, Londres, 1902.

  • 29.

    «Como operários que cooperam para um resultado, como membros de um organismo trabalhador, não são mais do que uma modalidade especial de existência do capital para o qual trabalham». A capacidade produtiva que desenvolvem «é a força produtiva do capital». K. Marx: Capital I, Penguin Classics, Londres, 1990, p. 267-269.

  • 30.

    P. Kropotin: op. cit., pp. 208 e 221.

  • 31.

    Ibid., p. 230.

  • 32.

    N. Folbre: op. cit., p. 356.

  • 33.

    Ibid.

  • 34.

    «Conceitualizamos como movimento que se (auto)reproduz não aquele movimento que surge e entra em colapso, e ressurge e volta a entrar em colapso, mas sim aquele que é capaz de manter uma continuidade diante de todas as suas transformações» (Christoph Brunner: «Debt, Affect and Self-Reproducing Movements», entrevista com Christian Marazzi, George Caffentzis e Silvia Federici em Instituto Europeo para Políticas Culturales Progresivas [eipcp], 25/5/2012, http://eipcp.net/n/1339011680). O conceito de «movimentos autorreprodutivos» se tornou um grito de alerta para inúmeros coletivos radicados nos eua, que rejeitam a separação – típica das políticas esquerdistas – entre o trabalho político e a reprodução diária de nossas vidas. Para um desenvolvimento elaborado deste conceito, v. a coleção de artigos publicados pelo coletivo Team Colors em seu blog In the Middle of the Whirlwind e o artigo publicado recentemente por Craig Hughes e Kevin Van Meter: «The Importance of Support, Building Foundations, Creating Community Sustaining Movements» em Rolling Thunder No 6, outono de 2008, pp. 29-39.

  • 35.

    Refiro-me particularmente à teoria do «trabalho imaterial» formulada por Antonio Negri e Michael Hardt em sua trilogia que começa com Imperio (Paidós, Barcelona, 2002), Multitud: Guerra y democracia en la era del Imperio (Debate, Barcelona, 2004) até Commonwealth: el proyecto de una revolución del común (Akal, Madri, 2011).

  • 36.

    Para ler mais sobre este assunto, v. o argumento sobre a teoria do «trabalho imaterial» de Negri e Hardt no artigo de S. Federici: «On Affective Labor» em Michael A. Peters e Ergin Bulut (eds.): Cognitive Capitalism, Education and Digital Labor, Peter Lang, Nova Iorque, 2011, pp. 57-74.

  • 37.

    A. Negri e T. Hardt: Multitud, cit.

  • 38.

    Sobre esta questão, v. Mariarosa Dalla Costa: «Women’s Autonomy and Remuneration for Carework in the New Emergencies» em The Commoner vol. 15, inverno de 2012.

  • 39.

    N. Folbre, L.B. Shaw e A. Stark (eds.): Warm Hands in Cold Age. Gender and Aging, Routledge, Nova Iorque, 2007, p. 164.

  • 40.

    A. Greenspan: The Age of Turbulence: Adventures in a New World, Penguin, Nova Iorque, 2007, p. 217.

  • 41.

    Elizabeth A. Watson e Jane Mears: Women, Work and Care of the Elderly, Ashgate, Burlington, 2007, p. 217.

  • 42.

    A organização das «comunidades de cuidados» é o projeto de alguns coletivos anarquistas, diy [Do It Yourself; faça você mesmo], em ambas as costas dos eua, que acreditam que estas comunidades são uma pré-condição necessária para a construção de movimentos «autorreprodutivos». O modelo destes é o trabalho solidário realizado por Act Up como resposta à expansão da aids dentro da comunidade gay durante os anos 80, que frente a todas as previsões marcou um importante ponto de inflexão no crescimento deste movimento. É possível encontrar mais informação sobre as «comunidades de cuidados» em alguns sites da internet (como o do Dicentra Collective de Portland, Oregon), assim como uma grande variedade de publicações produzidas sobre este assunto. Sobre o mesmo tema, v. C. Hughes e K. Van Meter: op. cit., pp. 29-39.

Este artículo es copia fiel del publicado en la revista Nueva Sociedad , Novembro 2015, ISSN: 0251-3552


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